Bento de Núrsia
Os dias eram assustadores. Os chamados bárbaros, povos do Norte, estão chegando às portas de Roma. Em Núrsia (Itália Central), cada viajante que chega com notícias é recebido com alvoroço. O povo se comprime para ouvir as novas, cada vez mais alarmantes.
Corre o ano de 480. Sob esse clima é que nasce o menino Bento, filho de uma das mais ricas famílias do lugar. Seu nascimento passa quase desapercebido, ante a inquietação que vive o povoado.
Seu pai tem grandes planos para ele. Em pleno ocaso da civilização romana, em plena juventude, Bento é encaminhado a Roma, para o estudo de Humanidades. O pai almeja-o funcionário com carreira brilhante. Estuda gramática, retórica, que abre caminho ao cursus honorum que proporciona poder, honra e boas relações aos jovens de sangue romano e regular fortuna.
Bento se cansa com rapidez desse ambiente, onde os romanos desprezam os que consideram “bárbaros”. Aos 18 anos, observando a declarada guerra entre duas facções religiosas pelo trono papal, desilude-se do estudo, da ciência e busca um refúgio para se isolar, desejando servir a Deus.
Penetra no vale de Subíaco e, encontrando um monge de nome Romano, toma de um simples hábito de frade e adentra uma caverna, aberta na rocha. Durante três anos, alimentado pelo pão que lhe oferta Romano, através de um cesto que baixava com uma corda, vive Bento isolado.
Até que um dia, enfrentando os penhascos, um sacerdote encontrou Bento. Compartilham a refeição, conversam longamente. Após sua partida, Bento se põe a pensar: ele havia descoberto uma nova forma de viver a religião, sem suprimir os prazeres serenos da amizade.
Cogita assim, fundar uma comunidade religiosa. Enquanto amadurece a idéia, monges o buscam e pedem-lhe para ser seu Abade, próximo de Vicovaro. Eles viviam como anacoretas, isto é, cada qual por conta própria, reunindo-se somente para rezar e comer e desejam ser orientados por Bento, que conta, então, 30 anos de idade.
Ele somente aceita, depois de muita insistência. Logo, por estabelecer regras rígidas de disciplina, eles atentariam contra sua vida. Sem rancor, rogando a Deus para que os abençoe, ele retorna a Subíaco, onde orienta os que ali se reuniam na construção de doze mosteiros espalhados por vales e colinas.
Subíaco se transforma em um centro para aprendizado e espiritualidade. Um frade de nome Florêncio, invejoso da tarefa que desenvolve Bento e suas comunidades, tenta minar-lhe o trabalho, difamando-o. Não o conseguindo, envia-lhe um pão envenenado, “em nome da paz e da caridade.”
Salvando-se do novo atentado à sua vida, Bento resolve abandonar a região. Com cerca de 50 anos, decide aplicar os frutos da sua experiência. Em Monte Cassino, funda uma comunidade onde se alia à penitência, o trabalho, a oração e a alegria.
Alguns monges o seguem e ele organiza o mosteiro. Um lugar aprazível, cuja construção se baseia fundamentalmente na velha casa de campo romana. Tudo nela deve revelar o ideal monástico: satisfazer às exigências da oração e da vida comum; dar hospitalidade aos refugiados; dispor de locais para as tarefas indispensáveis.
As regras são rígidas. Os monges se levantam às duas da madrugada. As primeiras horas são para a oração e o ofício da aurora. Depois, uma hora de leitura e meditação. A horta, o campo, as demais atividades no mosteiro lhes tomarão oito horas. Depois da ceia da noite, um pouco mais de oração e vigilância, antes de se recolherem aos leitos.
Monte Cassino foi uma revolução em termos de comunidade religiosa, dando início ao monasterismo ocidental.
Numa época em que as facilidades concedidas pelos imperadores, a convivência com o poder e as conversões em massa, por vezes superficiais, traziam o afrouxamento da religiosidade, o afastamento do mundo parecia ser uma condição mais favorável para se chegar à prática religiosa.
Os últimos dias de Bento são repletos de pressentimentos. Prediz a própria morte. Também vaticinou que o Mosteiro de Monte Cassino seria destruído, o que ocorreu 30 anos depois, durante uma invasão lombarda.
Seis dias antes da sua morte, Bento mandou que fosse aberta a sepultura, ao lado do túmulo de sua irmã, Escolástica (considerada Santa pela Igreja Católica), por quem tinha grande apreço. No dia 21 de março de 547, acometido de febres, enquanto orava no altar, expirou.
Em O Livro dos Médiuns, cap. XXXI, item V, assinando-se São Bento, escreve: “ É bela e santa a vossa Doutrina. (…) A estrada que vos está aberta é grande e majestosa. Feliz daquele que chegar ao porto.(…)”
No ano de 1964, a 24 de outubro, o Papa Paulo VI o proclamou Patrono principal da Europa, por ter sido “mensageiro de paz, operador da unidade, mestre de civilização e, sobretudo, exemplo de fé e iniciador da vida monástica no Ocidente.”
Na arte litúrgica ele é mostrado como um monge carregando uma cópia da sua Regra ou lendo um livro.
Livro:Grandes Espíritas do Brasil
Autor: Zêus Wantuil
Editora: Federação Espírita Brasileira